“Se os teus olhos forem bons”: ampliando a visão que transforma
Mt 6.22
O texto bíblico de Mateus 6.22, na tradução de Frederico Lourenço, da Universidade de Coimbra é cirúrgico: “Se o teu olho for simples, todo o teu corpo será luminoso”. Visão e simplicidade juntas: é a ampliação com a profundidade.
A visão é o sol que arde dentro da gente iluminando qualquer um que cruzar o nosso caminho. Por isso alguém sem visão é um desastre: do latim, des (não) + astrum (astros): alguém sem estrelas, só noite escura. O desastre de um céu vazio.
Acho muito interessante que o termo enfatizado no texto bíblico é a palavra olho, e não visão. Muita gente olha, mas não vê. Para que a visão seja exercitada com clareza, é fundamental curar o olhar, ajustar o foco, transformar o modo de ver.
Ver bem não é ver tudo, é ver com qualidade. É saber o que não ver.
Quero apontar três direções que podem indicar a saúde da nossa visão:
1 – A direção contrária: ver num mundo de cegos
Antes de ver é preciso tirar a venda dos olhos: vendas e cabrestos ainda diminuem o alcance de muitos olhares. Ver no contraditório é um jeito inteligente de enxergar: quem só vê as mesmas paisagens sabota o próprio ato de viajar.
Quem vê bem, vê beleza no contraditório: aprende que o seu ângulo de visão não esgota a perspectiva dos outros.
2 – A direção imaginativa: ver com os olhos da alma
A imaginação é uma dádiva que guardamos no baú da vida quando crescemos. Grande perda! A visão imaginativa é uma poderosa aliada dos que tem coragem para amplificar a própria experiência.
Quem vê com a imaginação curada, vê com os olhos de quem ama: é a retina da infância. Olhos cansados trocam a retina feliz pela tristeza da rotina.
3 – A direção espiritual: ver o sobrenatural na vivência do natural
Infelizmente, muitos amargam uma terrível miopia espiritual crônica. Gente que vê só o mal não tem saúde espiritual. O espiritual não é um esoterismo desencarnado e sem lugar no mundo real, é o que cabe no abraço, é o que nos faz ver a lágrima e estender a mão que ajuda: sem o espiritual sobra só o corpo presente, mas sem presença: cadáver adiado.
No mundo das repetições enfadonhas e paisagens viciadas, precisamos de um retorno ao olhar curado, uma redescoberta das paisagens da alma.
Há muita beleza para ser vista.
Alan Brizotti